domingo, 13 de maio de 2012

faces da mulher

Emaranhado nos cabelos louros dela, pediu: _ Depois de tudo passado, porque não tinges de preto? surpresa, curiosa, sente uma pontada doída.. _ E perder meus tons naturais? _ Tens agora que se fazer toda mulher - escancarar a si mesma em uma máscara - ele diz. _ Pois queres me ver mentirosa? _ Sim, depois que tudo passar, quero ver-te mentir, e inebriar-me dos prazeres de teus mistérios; além do que, só eu - teu marido - é que saberei das mechas louras ocultas pela tinta. Numa sala de desconhecidos, onde encantarás a todos com tua pose, só eu saberei da tua verdade. _ Pois se me queres tão radicalmente distinta apenas para gabar-se de (de)ter minha verdade, prefiro continuar em meus tons claros, mesmo depois de tudo passar. Indigna-se: _ Serás minha esposa como também é namorada? igualzinha? _ Igualzinha?- ofende-se ela - Jamais!

terça-feira, 1 de maio de 2012

Maio

É bem cedo de manhã, bem cedo mesmo, mas algo de urgente me acontece, uma pressa incontrolável, ímpeto de correr atrás de... sei lá o quê... chegou? chegou o dia? O mês chama-se maio, outono no hemisfério sul, mês das noivas importado da Europa. As noivas todas de sapatos brancos e tulipas no buquê, elas estão juntas na Europa caminhando em um parque verde, faz sol! Sapatos brancos! Cadê os meus? Preciso correr, já é de manhã, o mês é maio, faz um frio que eu não sinto, o salão de cabeleireiros é quente com todos os secadores de cabelo ligados ao mesmo tempo, o ruído monótono me ensurdece e eu penso que... precisava encontrar meu vestido, ficou em casa? na loja? não agüento mais esses secadores, preciso correr, o tempo é curto, o mês já é maio, corro pelas ruas porque não encontro nenhum taxi, tenho que correr até lá, até onde estamos combinados! onde? pergunto as horas a alguém na rua, não encontro taxi nenhum, vou a pé mesmo, chegarei a tempo. Meu cabelo: ok. Meu vestido? Meu Deus, estou com ele no corpo, é ele mesmo, olho meus seios, meus pés: todos emoldurados pelo vestido, mas que horas foi que eu o coloquei? Alívio de estar vestida, vou andando num passo mais ligeiro, acho que está ficando calor, não posso suar! o fedor do suor vai estragar tudo, será que encontro um desodorante? Procuro farmácias, todas sumiram, como os taxis, será possível? Chegou o dia, o mês é maio, é feriado? Domingo?? (não pode ser, lembro que escolhi um sábado). Tem algo de errado, algo se arrasta: é o vestido! Olho pra trás, sua calda negra, suja de rua. Mas como pode ser isso? Eu cortei tudo certinho, barra do vestido rente ao chão. Fiz tudo rente, rente, rente ao salto dos... sapatos?? Lembrei! Tinha me esquecido dos sapatos. Não levei ao salão. Não levei a lugar nenhum.... Ficaram na Europa? (visualizei-os num lindo parque verde, esquecidos no gramado).Comprarei sapatos, tem algum shopping no caminho, eu sei que tem um na Av. Paulista, vou caminhando por ela, faz mais calor e o vestido se arrasta, parece que carrego também um véu enorme, melhor segurá-lo nas mãos antes que alguém pise nele. Olho a ponta do véu, tem uma marca de tênis marrom. Sim: uma marca de tênis marrom! Quem dera eu estar com aqueles tênis para que pudesse correr, pergunto as horas mas não tenho sucesso, as pessoas tem seus relógios parados, todas as pessoas na rua desconhecem as horas e - pior ainda - não me olham com o menor espanto. Noiva feia, eu? Noiva que passa desapercebida? Eu? Meu peito para, como os relógios, não sinto mais além de uma paralização dilacerante. Ensaio uma lágrima que rola negra pelo meu rosto: sim, eu tinha feito maquiagem e nem me lembrava. No shopping, muitas pessoas conhecidas olhando-me com ressentimento, eu não havia contado a elas sobre a importância do mês de maio, eu havia me esquecido delas todas enquanto pensava no vestido, nos secadores, nos sapatos, nas tulipas... Não, não são tulipas! São orquídeas! Orquídeas?? Minha mãe disse que eram grandes demais, preciso ligar pra minha mãe, não me lembro mais das flores, nem do número dos sapatos, eu calço 37? 35? Meus pés cansados e negros de sujeira parecem de criança, esqueci de passar esmalte de adulto. Esqueci de pedir pra maquiadora passar um corretivo nas minhas olheiras, me dão ar de velha, de cansada... É, devo ser uma criança velha, é isso, uma criança que sonhava com princesas se casando na Europa. Acho que é tarde, é tarde demais agora, minha mãe não me atende mais, o noivo não pode me ver assim: estraga a surpresa! Quem é que vai me acudir se não há taxis nem na av, Paulista! E além de tudo o que já me ocorreu nesse pesadelo!, sinto... que vai chover. Deve ser meio-dia já, e vai chover! Chove em maio? Minha mãe disse que não... (mas eu acho que só não chove na terra das princesas, onde estão secos e lustrados meus belos sapatos brancos)

sexta-feira, 20 de abril de 2012

realização

E teve um dia... em que me senti tão sozinha e desamparada que inventei uma gravidez pra conversar com a barriga. Uma vez em que o mundo parecia tão incerto que eu inventei um "sim" em busca de consumar algum alívio ao meu corpo levitante. Outras vezes em que tudo era só saudade e tolerar qualquer momento presente era inventar um chão a um buraco infinito. Também arrebatar-me na aflição de sentir algo era inventar-me a mim mesma efêmera em meio ao perene. E agora dizer que SEI e QUERO é inventar um vida inteira a qual todos dizem: "sim". Agora inventar uma história de amor perene (em meio ao efêmero) é motivo justo pra que alguma história se realize.

domingo, 15 de abril de 2012

segunda-feira, 9 de abril de 2012

constelações imaginárias de um senhor

feitas de pequenas estrelas, faiscando antigas paixões
feitas de palavras ao vento, ditas uma só vez
feitas de memórias
desejos e tempo caminhado

são enfeites da vasta noite
em que apenas o silêncio impera
silêncio sepulcral
silêncio espacial
silêncio da solidão

constelamos, neste silêncio idoso, pequenos grupos de pessoas(-estrela)
companhias sonhadas
recordadas com saudade
será que ainda são verdade?

(na vida deste viúvo solitário)

terça-feira, 3 de abril de 2012

segunda-feira, 2 de abril de 2012

ao amigo que reencontro

Pois se queres saber de minha vida, te conto as boas novas:
mês que vem, vou me casar!
de véu, grinalda, noivo de paletó
com data, hora e lugar marcado

sim, chegou-me esta hora
tu que me dizias pra aproveitar a meninice
o descompromisso da adolescência
a doçura dos amores fugazes

chegou-me esta hora

ajeitar-me numa cama de casal
a um corpo que não é meu
recém-nascida para o tempo a dois

chegou-me esta hora

ele que me tens como espécie rara
que gosta de me olhar a cara
que gosta de beijar
até o dedão do meu pé

vou sim, vou viver com ele
e refazer-me toda
resgatarei
o que nunca soube que era meu.

e tu,
que me escutas agora,
irás me reconhecer?