quinta-feira, 2 de agosto de 2012
domingo, 29 de julho de 2012
A crise
E veja lá se não é verdade
que quando vou embora de onde sou cativada pelo cheiro
(cheiro de prenúncio de felicidade)
a vontade que me dá é de voltar!
que quando vou embora de onde sou cativada pelo cheiro
(cheiro de prenúncio de felicidade)
a vontade que me dá é de voltar!
sábado, 21 de julho de 2012
Vou abrir um restaurante no décimo andar:
Comida à vontade
Paga-se com a visita e o vinho
Quiçá uma torta de limão
Ou algum presente lá da Bahia pra essa terra tão fria...
Espagueti pra quem gosta de espagueti
Com alho e champingons
Ou um bom tomate pelado
Sálvia, salsinha e manjericão
Frango pra quem gosta de frango
Curry importado da Costa Rica
Teryaki importado da GNT
E as jacked potatoes do Jamie Oliver!!
Pão de queijo pra quem gosta de cerveja sem barriga vazia
Ou castanha de caju
Ou coalhada da vovó
Quem sabe um dia até uns bolinhos de aipim (óleo na cozinha,
ai de mim)
Carne vermelha pode ser rosbife caseiro num sanduba
Ou um fraternal filé ao molho mostarda
Ou uns hambúrgueres feitos pelo marido
Sócio e auxiliar da cozinha do décimo andar
No fim de tudo, uvas eternas
Hálito de um bom pesto
Sono e barriga cheia
Comida é amarração pro amor!
(aprendam, periguetes! aprendam, astrólogos da patifaria!)
quinta-feira, 19 de julho de 2012
da fertilidade e da morte
...algo me diz que aquilo que me fertiliza, me entope. e vou transbordando até o fim, até o talo do talo. E de repente, não sou mais fértil: sou um corpo pequeno, enfiado em um sofá, e os pensamentos rodam e rodam dentro dele, e nada de novo acontece.
Nada de novo pode acontecer no já sabido.
Os mesmos pensamentos em cada minuto que vem.
É da repetição que nasce a vida?
Eu quero estar fértil, preciso abrir uma porta...
(esse mundo todo feito de portas fechadas, umbigos, umbigos)
Eu quero estar fértil,
retirar-me do que faz morrer, apontar o dedo pra cara da morte (essa morte feita de umbigos gelados e estáticos nos lugares já sabidos que ocupam, essa morte sem dignidade, essa morte que acontece aos vivos) e denunciá-la com toda a raiva que posso sentir.
Denunciar todo o abuso, toda a sedução barata: o que me faz morrer.
A raiva gritada: será o parto que procuro.
Nada de novo pode acontecer no já sabido.
Os mesmos pensamentos em cada minuto que vem.
É da repetição que nasce a vida?
Eu quero estar fértil, preciso abrir uma porta...
(esse mundo todo feito de portas fechadas, umbigos, umbigos)
Eu quero estar fértil,
retirar-me do que faz morrer, apontar o dedo pra cara da morte (essa morte feita de umbigos gelados e estáticos nos lugares já sabidos que ocupam, essa morte sem dignidade, essa morte que acontece aos vivos) e denunciá-la com toda a raiva que posso sentir.
Denunciar todo o abuso, toda a sedução barata: o que me faz morrer.
A raiva gritada: será o parto que procuro.
segunda-feira, 9 de julho de 2012
Milan Kundera
"O olhar do homem já foi descrito muitas vezes. Ele pousa friamente sobre a mulher, ao que parece, como se a medisse, a pesasse, a avaliasse, a escolhesse, ou seja, como se a transformasse em coisa.
O que não se sabe tão bem é que a mulher não está inteiramente desarmada contra esse olhar. Se ela é transformada em coisa, ela então observa o homem com o olhar de uma coisa. É como se o martelo tivesse de repente olhos e observasse fixamente o pedreiro, que se serve dele para enfiar um prego. O pedreiro vê o olhar mal do martelo, perde a segurança e dá uma martelada no próprio dedo. O pedreiro é o senhor do martelo, porém é o martelo que leva vantagem sobre o pedreiro, porque a ferramenta sabe exatamente como deve ser manejada, enquanto aquele que a maneja só pode sabê-lo mais ou menos. O poder de olhar transforma o martelo em ser vivo, mas o bravo pedreiro tem de sustentar seu olhar insolente e, com a mão firme, transformá-lo novamente em coisa. Dizem que a mulher vive assim um movimento cósmico para o alto e depois para baixo: a elevação da coisa tornada criatura e a queda da criatura tornada coisa".
O livro do riso e do esquecimento
O que não se sabe tão bem é que a mulher não está inteiramente desarmada contra esse olhar. Se ela é transformada em coisa, ela então observa o homem com o olhar de uma coisa. É como se o martelo tivesse de repente olhos e observasse fixamente o pedreiro, que se serve dele para enfiar um prego. O pedreiro vê o olhar mal do martelo, perde a segurança e dá uma martelada no próprio dedo. O pedreiro é o senhor do martelo, porém é o martelo que leva vantagem sobre o pedreiro, porque a ferramenta sabe exatamente como deve ser manejada, enquanto aquele que a maneja só pode sabê-lo mais ou menos. O poder de olhar transforma o martelo em ser vivo, mas o bravo pedreiro tem de sustentar seu olhar insolente e, com a mão firme, transformá-lo novamente em coisa. Dizem que a mulher vive assim um movimento cósmico para o alto e depois para baixo: a elevação da coisa tornada criatura e a queda da criatura tornada coisa".
O livro do riso e do esquecimento
terça-feira, 26 de junho de 2012
os vizinhos
Aqui da janela eu a vejo na varanda, fumando seu cigarrinho de frente pra São Paulo toda. A cidade se iluminando as seis e pouco da tarde, terça-feira barulhenta por todos os lados, e ela alí, tranqüila com seu cigarro. Estará sozinha, esperando o marido? Ou esperando uma torta assar no forno? Já senti cheiro de comida da casa dela uma vez que abri a porta do elevador, a vizinha cozinha! As patinhas do cachorro também já chegaram aos meus ouvidos, em geral quando é tarde da noite e há silêncio (melhor momento do dia).
Do meu ângulo consigo ver apenas um abajur, a ponta de um tapete e parte do encosto do seu sofá: branco. Será dessas que tem a casa toda branca, seguidora das tendências da moda? A sua janela é como a minha, sem cortina. Talvez se importe pouco com privacidade, talvez goste da luz entrando perpetuamente em seu apartamento. Talvez seja vagarosa na aquisição das coisas, também recém-chegada ao edifício.
A rede de internet aberta que me aparece de tempos em tempos, seria dela? Se for, nunca vai saber que sou eu quem está roubando seu sinal. Se for vagarosa no que faz, pouco vai se incomodar se a internet lentificar um pouquinho. Ela aguardará, pacientemente, cada página da web se abrir, enquanto assa sua torta, enquanto cuida do cãozinho, enquanto fuma seu cigarro. Esperta, colocou uma cadeira confortável em sua varanda. Pra fumar confortável, bem instalada. Não quer deixar a casa fedorenta, vai que o marido não gosta. Esperta, deixa tudo cheiroso pro marido, os cheiros são essenciais no amor. Até o cachorro precisa estar cheiroso. E o gato. Sim, também tem um gato na casa da vizinha, que gosta de ficar imóvel na varanda. Nunca o vi junto com ela, em geral eu o vejo junto com o cachorro. Provavelmente quando os vizinhos saem, e os bichanos precisam um do outro para aplacar a solidão. Mas ela não - não tem necessidade de aplacar a solidão, porque gosta dela. Gosta de estar consigo mesma, é de se notar que está em paz com os bichanos soltos pela casa. Seu cachorro não late, fiel ao silêncio de seu apartamento. Fiel até mesmo a mim, vizinha de porta, que detesta latidos estridentes.
A rede aberta que me aparece chama-se linksys - não, ela não daria esse nome a rede. Sua rede deve ter nome de mulher, e pensando bem, provavelmente só se pode acessá-la com senha. A vizinha é esperta. Ela e o maridão inventaram uma senha que ninguém nunca vai descobrir, provavelmente um nome ou uma data boba da história deles: nunca a data do casamento! (fácil demais). Quem sabe a data da primeira transa, ou de uma viagem que fizeram anos atrás. A vizinha não é muito nova, tem cara de estar casada há muito tempo e de confidenciar com o marido milhares de histórias que morrerão com eles...
Vai que um dia não bato em sua porta, a passos de onde estou. Nem que seja pra perguntar seu nome, daria um título melhor a essa postagem...
Do meu ângulo consigo ver apenas um abajur, a ponta de um tapete e parte do encosto do seu sofá: branco. Será dessas que tem a casa toda branca, seguidora das tendências da moda? A sua janela é como a minha, sem cortina. Talvez se importe pouco com privacidade, talvez goste da luz entrando perpetuamente em seu apartamento. Talvez seja vagarosa na aquisição das coisas, também recém-chegada ao edifício.
A rede de internet aberta que me aparece de tempos em tempos, seria dela? Se for, nunca vai saber que sou eu quem está roubando seu sinal. Se for vagarosa no que faz, pouco vai se incomodar se a internet lentificar um pouquinho. Ela aguardará, pacientemente, cada página da web se abrir, enquanto assa sua torta, enquanto cuida do cãozinho, enquanto fuma seu cigarro. Esperta, colocou uma cadeira confortável em sua varanda. Pra fumar confortável, bem instalada. Não quer deixar a casa fedorenta, vai que o marido não gosta. Esperta, deixa tudo cheiroso pro marido, os cheiros são essenciais no amor. Até o cachorro precisa estar cheiroso. E o gato. Sim, também tem um gato na casa da vizinha, que gosta de ficar imóvel na varanda. Nunca o vi junto com ela, em geral eu o vejo junto com o cachorro. Provavelmente quando os vizinhos saem, e os bichanos precisam um do outro para aplacar a solidão. Mas ela não - não tem necessidade de aplacar a solidão, porque gosta dela. Gosta de estar consigo mesma, é de se notar que está em paz com os bichanos soltos pela casa. Seu cachorro não late, fiel ao silêncio de seu apartamento. Fiel até mesmo a mim, vizinha de porta, que detesta latidos estridentes.
A rede aberta que me aparece chama-se linksys - não, ela não daria esse nome a rede. Sua rede deve ter nome de mulher, e pensando bem, provavelmente só se pode acessá-la com senha. A vizinha é esperta. Ela e o maridão inventaram uma senha que ninguém nunca vai descobrir, provavelmente um nome ou uma data boba da história deles: nunca a data do casamento! (fácil demais). Quem sabe a data da primeira transa, ou de uma viagem que fizeram anos atrás. A vizinha não é muito nova, tem cara de estar casada há muito tempo e de confidenciar com o marido milhares de histórias que morrerão com eles...
Vai que um dia não bato em sua porta, a passos de onde estou. Nem que seja pra perguntar seu nome, daria um título melhor a essa postagem...
quarta-feira, 13 de junho de 2012
Reencontre (après marriage)
esquecido, querido blog
que já me acompanhou por tantos meses na vida de projeções mirabolantes
e esperanças românticas
de feminina solitária que sempre fui
esquecido em um computador
habitante dos fundos de um armário de menina
fiel guardador de todas as roupas e apetrechos
de vinte e oito anos de infância
reencontro-te agora
recém-instalada em um recente lar
que vai abrigar os dias mais lindos
da nossa família recém-desejada
reencontro-te em minha cama
berço de noites que desconheço
de um sentimento que me invade, agora
e vai se perpetuar, inevitável, pelos dias de mulher.
que já me acompanhou por tantos meses na vida de projeções mirabolantes
e esperanças românticas
de feminina solitária que sempre fui
esquecido em um computador
habitante dos fundos de um armário de menina
fiel guardador de todas as roupas e apetrechos
de vinte e oito anos de infância
reencontro-te agora
recém-instalada em um recente lar
que vai abrigar os dias mais lindos
da nossa família recém-desejada
reencontro-te em minha cama
berço de noites que desconheço
de um sentimento que me invade, agora
e vai se perpetuar, inevitável, pelos dias de mulher.
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