eis que, aos olhos dos outros, sou aquilo que cada um vê.
"eu-mesma" esbarro no claro limite do outro "ele-mesmo"...
a vida é tragicômica: caminha-se quilômetros, vive-se por anos - às voltas do próprio umbigo.
(e quem diria, já foi ligado por um ínfimo cordão à barriga que nos guardou, iniciantes no mundo que éramos)
.....................
apenas durante um apaixonado momento de volúpia, é que um umbigo novamente se liga a outro.
no mais: egoístas e invejosos, esses somos os si-mesmos.
seres pensantes vivendo o cio eterno.
no mais: erotizados por natureza, polimorfos-perversos (pra não dizer na ordem freudiana)
.....................
eis que, aos olhos dos outros, sou aquilo que alguém já viu em idealização: sou sonho já sonhado.
quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012
quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012
a espera de uma fotografia
acordei no meio da noite
sufocado
saí do quarto, entregue aos caminhos que percorro automaticamente em minha casa;
passei pelo banheiro,
desejei uma banheira de sonhos
e bolhas de papel,
(bodas de papel?)
desejei uma fantasia louca
uma mulher rouca
tentando gemer pra mim,
desejei uma festa colorida
entorpecentes de graça
sem fila pra ir ao banheiro,
(filha pra ir ao banheiro?)
desejei ter dela um bebê
fazer-lhe bem
dormir sobre sua barriga
desejei um grande cotonete
que me penetrasse, esvaziando-me de mim
invadido e esvaziado, como uma mulher sofrida
(ardida?)
desejei uma gravata
pra que ela me botasse em frente ao espelho
e me engomasse, como a um menino paparicado.
encontrei-me nu, no sofá
em frente a um porta-retratos
ainda sem fotografia.
sufocado
saí do quarto, entregue aos caminhos que percorro automaticamente em minha casa;
passei pelo banheiro,
desejei uma banheira de sonhos
e bolhas de papel,
(bodas de papel?)
desejei uma fantasia louca
uma mulher rouca
tentando gemer pra mim,
desejei uma festa colorida
entorpecentes de graça
sem fila pra ir ao banheiro,
(filha pra ir ao banheiro?)
desejei ter dela um bebê
fazer-lhe bem
dormir sobre sua barriga
desejei um grande cotonete
que me penetrasse, esvaziando-me de mim
invadido e esvaziado, como uma mulher sofrida
(ardida?)
desejei uma gravata
pra que ela me botasse em frente ao espelho
e me engomasse, como a um menino paparicado.
encontrei-me nu, no sofá
em frente a um porta-retratos
ainda sem fotografia.
quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012
infância
Fazes parte de minha vida como jamais fizeste
como se me pudesses assaltar a memória
e converter-te em minha única história.
Encontro-te em eterno reencontro
como quando vou a praia e avisto o mar
o mesmo mar de minha infância
penetra-me nas mais recentes fotografias
as de ternura, as de todo dia
as das viagens mais lindas.
E mesmo meu passado
vai se infiltrando dentro deste momento
e misturando-se a ti;
tu que és matéria densa
que me corres pelo interior como sangue
e num corte jorras para fora, separado de mim.
E ao teu lado posam os meus amigos (espelhos meus)
dos novos aos antigos
renovados diante da força da tua companhia
reencontro-te
a cada vez que os olho nos olhos
ávida por me descobrir como jamais esperava ser.
Reencontro-me em ti, a todo o momento
tu és minha história até aqui
já que sempre perambulastes ao me redor, desde criança.
como se me pudesses assaltar a memória
e converter-te em minha única história.
Encontro-te em eterno reencontro
como quando vou a praia e avisto o mar
o mesmo mar de minha infância
penetra-me nas mais recentes fotografias
as de ternura, as de todo dia
as das viagens mais lindas.
E mesmo meu passado
vai se infiltrando dentro deste momento
e misturando-se a ti;
tu que és matéria densa
que me corres pelo interior como sangue
e num corte jorras para fora, separado de mim.
E ao teu lado posam os meus amigos (espelhos meus)
dos novos aos antigos
renovados diante da força da tua companhia
reencontro-te
a cada vez que os olho nos olhos
ávida por me descobrir como jamais esperava ser.
Reencontro-me em ti, a todo o momento
tu és minha história até aqui
já que sempre perambulastes ao me redor, desde criança.
quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012
quantos tijolos?
De quantos tijolos preciso pra construir uma casa?
uma base de umas duas dezenas pra assegurar a existência de um chão.
(casa sem chão é como viver em suspensão)
uns tantos centésimos pra levantar paredes
(as paredes escondem-nos dos maus olhos)
o telhado não se faz com tijolos
nem as janelas
o primeiro protege das precipitações
(e também do céu estrelado)
as segundas desvendam um pouco do mistério do dentro
(fazem vista grossa aos olhos)
e quando o mundo todo olha e olha sem parar:
o melhor é construir paredes mais altas?
tijolos no teto?
vedar as janelas?
ou sair pela porta, vestido de tijolos?
uma base de umas duas dezenas pra assegurar a existência de um chão.
(casa sem chão é como viver em suspensão)
uns tantos centésimos pra levantar paredes
(as paredes escondem-nos dos maus olhos)
o telhado não se faz com tijolos
nem as janelas
o primeiro protege das precipitações
(e também do céu estrelado)
as segundas desvendam um pouco do mistério do dentro
(fazem vista grossa aos olhos)
e quando o mundo todo olha e olha sem parar:
o melhor é construir paredes mais altas?
tijolos no teto?
vedar as janelas?
ou sair pela porta, vestido de tijolos?
segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012
mãe terra
fazia frio, e ela tinha até se esquecido de levar um casaco.
envolta pelo calor do próprio corpo, caminhava por entre as árvores.
a cada passo sobre as folhas secas, lembrava-se: era-lhe o único ruído.
ao redor, só silêncio.
estava sozinha.
estava sozinha.
e sua única liberdade era estar;
estar sendo.
alcançar léguas com o pensamento;
desenfreado, driblando o que a realidade poderia obstruir.
o som dos próprios passos entonavam o silêncio
e algo que poderia se assemelhar a uma saudade lhe acontecia.
o desejo de ser aconchegado por braços,
braços dos quais ela tinha recordação.
não eram braços pertencentes a alguém
alguma pessoa específica
com nome e identidade.
apenas um abraço,
roçando nela como música
nada mais.
poderia, assim, seguir sozinha
se deixadas pelos cantos as sementes que puderam germinar
durante toda a sua história de abraços.
envolta pelo calor do próprio corpo, caminhava por entre as árvores.
a cada passo sobre as folhas secas, lembrava-se: era-lhe o único ruído.
ao redor, só silêncio.
estava sozinha.
estava sozinha.
e sua única liberdade era estar;
estar sendo.
alcançar léguas com o pensamento;
desenfreado, driblando o que a realidade poderia obstruir.
o som dos próprios passos entonavam o silêncio
e algo que poderia se assemelhar a uma saudade lhe acontecia.
o desejo de ser aconchegado por braços,
braços dos quais ela tinha recordação.
não eram braços pertencentes a alguém
alguma pessoa específica
com nome e identidade.
apenas um abraço,
roçando nela como música
nada mais.
poderia, assim, seguir sozinha
se deixadas pelos cantos as sementes que puderam germinar
durante toda a sua história de abraços.
segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012
Da sucessão da Mulher pela mulher
...pisando em sapatos de salto alto, com medo de ser mais alta do que é, ela caminha. Para junto de seu homem ela caminha, passos firmes.
E sobe em um degrau, como a um pódio que homenageia seu próprio destino de mulher.
(escolhera, por fim, um destino).
E em seu corpo, a vida vai acontecer.
Carregarás, no próprio ventre, a sucessora de si.
E sobe em um degrau, como a um pódio que homenageia seu próprio destino de mulher.
(escolhera, por fim, um destino).
E em seu corpo, a vida vai acontecer.
Carregarás, no próprio ventre, a sucessora de si.
quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012
Hilda Hilst
Aflição de ser eu e não ser outra
Aflição de não ser, amor, aquela
que muitas filhas te deu, casou donzela
e à noite se prepara e se adivinha
objeto de amor, atenta e bela.
Aflição de não ser a grande ilha
que te retém e não te desespera
(A noite como fera se avizinha)
Aflição de ser água em meio à terra
e ter a face conturbada e móvel
E a um só tempo múltipla e imóvel
não saber se se ausenta ou se te espera
Aflição de te amar, se te comove
E sendo água, amor, querer ser terra.
Hilda Hilst
Aflição de não ser, amor, aquela
que muitas filhas te deu, casou donzela
e à noite se prepara e se adivinha
objeto de amor, atenta e bela.
Aflição de não ser a grande ilha
que te retém e não te desespera
(A noite como fera se avizinha)
Aflição de ser água em meio à terra
e ter a face conturbada e móvel
E a um só tempo múltipla e imóvel
não saber se se ausenta ou se te espera
Aflição de te amar, se te comove
E sendo água, amor, querer ser terra.
Hilda Hilst
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