"O olhar do homem já foi descrito muitas vezes. Ele pousa friamente sobre a mulher, ao que parece, como se a medisse, a pesasse, a avaliasse, a escolhesse, ou seja, como se a transformasse em coisa.
O que não se sabe tão bem é que a mulher não está inteiramente desarmada contra esse olhar. Se ela é transformada em coisa, ela então observa o homem com o olhar de uma coisa. É como se o martelo tivesse de repente olhos e observasse fixamente o pedreiro, que se serve dele para enfiar um prego. O pedreiro vê o olhar mal do martelo, perde a segurança e dá uma martelada no próprio dedo. O pedreiro é o senhor do martelo, porém é o martelo que leva vantagem sobre o pedreiro, porque a ferramenta sabe exatamente como deve ser manejada, enquanto aquele que a maneja só pode sabê-lo mais ou menos. O poder de olhar transforma o martelo em ser vivo, mas o bravo pedreiro tem de sustentar seu olhar insolente e, com a mão firme, transformá-lo novamente em coisa. Dizem que a mulher vive assim um movimento cósmico para o alto e depois para baixo: a elevação da coisa tornada criatura e a queda da criatura tornada coisa".
O livro do riso e do esquecimento
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