quarta-feira, 8 de junho de 2011

a wanda

É possível ser impenetrável a muita coisa
Stress
Poeira
Choro de bebê
Olho gordo
Buzina de caminhão
Telemarketing
Bocejo do fulano ao lado
Demanda de atenção
Àquela pergunta cretina:está tudo beeeem??

É possível ser IMPenEtRÁveL, pelo menos em aparência; mas se porventura há cumplicidade, então há condescendência.
Os poros existem para serem penetrados.

A Wanda parece impenetrável
Deprimida e isolada, caso grave
Mantém-se sozinha
Longe das gentes
Mas aceita companhias
E hesita aos convites
Se espera alguém convidá-la, é para sentir o gosto da dúvida
Dizer "não" (nada como um sonoro NÃO) mesmo querendo, no fundo, dizer sim
Pois o interesse do outro por ela será sempre uma dádiva
E guardar-se, isto sim, é a dádiva maior.

A Wanda é uma senhora
Senhora de uma vida de sessenta anos
Bonita e elegante
Guarda dentro de si uma jornada de clausura
Uma longa busca pela expressão do que tem de feminino
A Wanda é dessas mulheres atuais
Que carregam um passado marcado pelo machismo
É dessas que se perguntam se o outro convida pelo prazer da sua companhia
Ou pelo prazer da posse

Porque a Wanda foi possuída por seu marido
Um ciumento que já morreu
Um ciumento que a impediu de trabalhar
E nela fez três filhos, designando-a: Senhora Mãe (e nada mais)

A Wanda guarda em sua tristeza, não a sua viuvez
Mas a atual ausência dos filhos (adultos)
A solidão
E a dificuldade de ser mulher num corpo de sessenta anos
Por sua vez num mundo de 2011 anos (moderno, é o que dizem)
Tão estranho a ela
Em que as mulheres são ...

O que?

Bem-sucedidas no mercado
Mães de proveta
Silicones ambulantes
A Wanda quer ser além, e não encontra por onde
Mas sempre toma a iniciativa de fumar seu cigarro no canto onde gosta
E é nesta brecha que assume e expressa
A sua liberdade
A de ser penetrada pela volúpia de um bom cigarro
E ao soprar para fora seu EU-Volátil
Encontra o silêncio
aquele que a permite escutar o que fala dentro dela.

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